quinta-feira, 22 de setembro de 2011

TÉDIO



Tédio
A janela aberta, dia nublado
livros caídos no chão
Rosto desanimado
Primavera, o mudar da estação
O café
A filha
O tédio
A encheção
A mesma música
Tocando sem parar
Entender, entender, entender...
Começar de novo
Escrever, escrever, escrever...
E não poder falar
Um palavrão
Ser amável
Obrigada!
Lailin

quinta-feira, 8 de setembro de 2011

'A FALTA QUE ELA ME FAZ' (Jezinha)




Não encontro a única foto de nós duas
Tirada no SESC Paulista, décimo quinto andar
Uma tarde e um lindo céu azul...
Sentamos no muro próximo as flores e conversamos sobre cores
Você me ensinava o que usar com o meu tom de pele
Depois contou sobre sua vida
Sua infância e adolescência em Joinville
Foi o inicio de nossa amizade
Depois toda semana marcávamos um encontro na Brigadeiro esquina com Manoel da Nóbrega
Observava de longe você atravessando a rua vinda da Alfredo Lellis
Tão bonita
Quando meu pai morreu você me levou para sua casa me deu seu quarto de hóspede e fez do seu lindo apartamento a minha casa
Eu nunca te falei sobre aquele mês
Mês de agosto
Mês do meu desgosto
Você me abraçou, mas eu não chorei
Não chorei porque não vi meu pai dentro de um caixão rodeado de flores amarelas
Naquele mesmo ano em dezembro foi a vez de você perder o seu pai
Arrumou rapidamente as malas e foi para o sul
Não foi possível te abraçar e nem chorar com você
Meses depois voltou
Voltou diferente
Não era mais a Jezinha feliz de outrora
Algo nos afastou
Dois anos depois fiquei doente quatro meses distante
Quando voltei você estava grávida
Observava você de longe, sempre rodeada de amigos
Passavam  a mão em sua barriga
Levavam presentes
O último domingo que te vi, disse:
“Se precisar de mim me chama”
Não sei quanto tempo foi isso
Tres ou quatro domingos atrás
Agora, fiquei sabendo que perdeu o bebê, uma menina, e novamente viajou para o sul
Deixo meus dedos abrirem um livro, folheio algumas páginas, enquanto lembro da noite em que perdi meu bebê também
Quando foi?
Ontem? Não! Quase agora
Uma linda vida, uma menininha que escapuliu e desapareceu
Recordo  meu rosto virado para a parede
As lágrimas e os soluços e a voz de uma enfermeira dizendo: “Chora não”
Não foi há décadas
Foi quase agora quando eu olhava para esse teto
Pensando em você e ouvindo o som do meu coração
Nenhum outro som, a não ser talvez
Próximo à linha do trem, o barulho de rodas sobre um trilho
E um longo apito como um grito de tristeza
Cortando o ar da noite

(Márcia lailin – P/Jeruza)



quarta-feira, 7 de setembro de 2011

SONHO



Desperto em outra existência
Sonho
Crio estórias que nunca aconteceram
Vejo as mais belas cenas
E me sinto  feliz
Desloco-me para longe
Estou em dois lugares ao mesmo tempo
Reuno duas pessoas em uma
Ou a faço transformar-se em outra
Sou a autora
O sonho é meu invento o enredo
Onde o tempo  o espaço
E as atividades do meu corpo
Não tem poder algum

(Márcia Lailin)

terça-feira, 6 de setembro de 2011

Portão 7




Acompanho você com o olhar
Acabou de entrar pelo portão sete
Tem o semblante cansado, sigo-o com olhar
De repente some
Sento para escrever isto
Só para você saber que penso em você
Do meu lado no outro banco tem
Uma mãe amamentando um bebê
É agosto de 2011
Agosto do meu desgosto
Tomara que você não demore
A noite passada foi uma linda noite
Conversamos bastante
Contamos um pouco de nós dois
Depois exaustos nos calamos
Você foi sumindo vagarosamente pelo chão da sala
Como sombras da noite se misturando com a claridade da tela
Até amanhã!
(Márcia Lalin)


A linguagem esquecida


E se ele não existe?
Há um ano ele deixou os livros na portaria do prédio
No pacote um bilhete com um nome e um número: 12
Há um ano analiso essa letra
Quem é?
Nunca me canso de refletir
Era dia 28.08
Dia em que nasci
Como seria ele?
A mesma coisa:
Nasceu
Casou
Pessoa famosa
Grande biólogo marinho?
E por ai afora
Ou talvez ele prefira
Que fale sobre suas qualidades pessoais
A sua generosidade
O seu bom coração
A sua extraordinária
Tranquilidade de espirito.
(Mlailin)

“Sombra da minha sombra, doce e calma
Sou a quimera da tua alma
E, sem viver ando a viver contigo...
Deixa-me andar assim no teu caminho
Por toda a vida, amor, devagarinho...” 
(Florbela Espanca)

sábado, 3 de setembro de 2011

APOJATURA


Para Kieslowski

Manhã fria, final de inverno.
Não vou fazer um discurso politico
Quero dedicar-lhe o voo dos pássaros
Cujas penas refletem todas as cores do arco-íris
Uma pequena multidão de pequenas criaturas emplumadas
Seus trinados, apojaturas, silvos e tons aflautados
Proclamam uma alegre saudação ao novo dia.
Vou erguer minha visão sobre as flores silvestres,
Tocar as suas pétalas macias e delicadas
Embelezar o cenário,
Acrescentando uma dimensão impar a alegria de viver.
Ela também merece o sussurro secreto de uma coisa contorcida,
Inodora, emaranhada e linda.
O combustível para afugentar o frio do inverno,
Dar sombra para aliviar o calor do verão,
Balsamo para as feridas e até claridade para
A escuridão da noite.
E essa faixa que cobre o seu corpo
Ata-se ao som de uma música e o ruído
São dois meninos diferentes – um deleitoso e outro horroroso
Uma corda de violino
Uma pele de tambor,
A palheta de uma flauta
Uma emoção parecida a uma corrente ascendente transportando uma ave
Que sobe muito...
Depois de tantos anos
O véu esta sendo tirado
Eles estão recordando a ausente
Seguem em ônibus, carros, trens
Chegarão e dirão:
Sentimos muito a sua falta
Não sofrerá mais maus-tratos
Será amada
Nunca mais abandonada
(Marcia Lailin – 02.09.11)